2º Domingo da Quaresma – Ano B – 04/03/2012
1. Celebramos a certeza de que, – se Deus é por nós, – ninguém será contra nós. Na celebração da Eucaristia aprendemos a escutar o que o Filho amado do Pai tem a nos dizer … e, confiantes, – … não em nossas seguranças, – mas no Deus fiel às suas promessas, enfrentamos os absurdos da vida, os mistérios que perpassam indecifráveis a nossa existência, as perplexidades e os desafios que o mundo dos excluídos nos apresenta. A fé nos garante que é possível transfigurar (além da nossa vida) também a vida de quem carece de dignidade humana. Seguindo os passos de Jesus – que foi solidário conosco e se entregou por amor – queremos aprender a construir sociedade nova e história nova.R e f l e t i n d o . . .
2. O evangelho de hoje nos dá uma espiadinha no céu: Jesus revela sua glória diante de seus discípulos. Situando essa visão dentro da estrutura fundamental do evangelho de Marcos:
- na 1ª. parte de sua atividade Jesus se dirige às multidões mediante sinais e ensinamentos, que deixam transparecer sua “autoridade” … mas não dizem nada do seu interior.
- Na 2ª. metade (a partir de 8,27) Jesus revela – não à multidão, mas aos Doze, futuras testemunhas de sua missão, – seu mistério interior: sua missão de Servo Padecente (melhor, Filho do Homem padecente) e sua união com o Pai.
3. Na hora do Batismo, o que foi confiado a Jesus pessoalmente, pelo Pai, quando a voz da nuvem lhe revelou: “Tu és meu Filho amado, no qual está o meu agrado” (Mc 1,11), é agora, na transfiguração, revelado aos discípulos: “Este é meu Filho amado, escutai-o”.
4. O mistério do Enviado de Deus (não mais reservado a Jesus) é comunicado aos que deverão continuar sua missão. É-lhes revelado, embora não o entendam (9,10; cf.8,32s), ou melhor, porque não entendem, pois aproxima-se o momento do escândalo da cruz. Por isso, por uma frestinha podem enxergar um pedacinho do céu. E gostam!
5. “Façamos aqui três tendas…”, diz Pedro (porém, ele não sabia o que estava dizendo,9,6). Pois – Jesus não podia ficar onde estavam.
- Devia caminhar.
- Não há glória sem cruz, não há Páscoa sem Semana Santa (cf., 9,12b).
6. Muitos gostariam de que existisse Páscoa sem Semana Santa. Um Jesus festivo, jovem, simpático, com olhos românticos, com ar de revolucionário, mas não um Jesus esmagado e aniquilado! Marcos, porém, situa a visão da glória na perspectiva da cruz, no início do caminho que conduz ao Gólgota, logo depois do convite aos discípulos de assumirem sua cruz no seguimento de Jesus (8,34).
7. Aprendemos hoje que não dá e não devemos construir “tendas eternas” antes da hora. Jesus ainda tem muito a caminhar, e nós com ele. Mas, entretanto, precisamos de uma “pré-visão” de sua glória, para, – na noite do sofrimento, – não desanimarmos e enxergarmos o sentido final, revelado nas palavras: “Este é meu Filho amado…”.
8. Deus nos mostra que o mistério que nos salva é sua própria doação por nós, na morte de seu Filho. É o que nos diz Paulo na II leitura: “não poupou seu próprio Filho”. E para que entendamos o que significam estas palavras, a 1ª. leitura lembra o conflito que explodiu na alma de Abraão, quando Javé lhe pede o sacri-fício de seu único e querido filho ( – o filho que encarnava a promessa de descendência, o filho em quem estava toda a sua vida -).
9. A lógica de Deus é diferente da nossa. Nós diríamos que Jesus era um homem especial, o homem que interpretava, ensinava e vivia de modo perfeito a vontade de Deus. Portanto, deveria ser protegido, defendido, promovido, divulgado de todas as formas. Deus, não !!!
- Deus sabe que o coração humano é orgulhoso e só cai em si depois de destruir sua felicidade.
- Deus sabe que os homens só se convertem “elevando os olhos para aquele que traspassaram” (Zc 12,10).
- A sede do poder, a agressividade, só reconhece seu vazio depois de ter esmagado o justo que a ela se opõe.
Deus quis e quer pagar esse preço para conquistar o coração humano. O Filho que ele envolve com sua glória, e que recebe o testemunho da Lei e dos profetas (Moisés e Elias), Deus não o poupou, pois era preciso que realizasse sua oferta de amor até o fim. Eis o risco que Deus quis correr!
10. Mas não aboliu Deus os sacrifícios humanos desde Abraão? Deus pôs fim aos sacrifícios em que os homens oferecem outros homens. Mas, – em seu Filho, – ele mesmo quis sofrer para nos ganhar com seu amor. Ele mesmo quis viver o amor até o fim. Nele Deus “se perdeu” a si mesmo em seu amor por nós …
11. “Escutai-o”. Os ensinamentos de Jesus, que agora se seguirão, são os ensinamentos sobre a humildade, o despojamento, o serviço, a doação em prol dos “muitos” (10,45). Só podemos aceitar este ensinamento na confiança de que “ele teve razão” quando deu sua vida por nós. É isto que a liturgia de hoje, antecipadamente, nos deixa entrever.
12. Se no domingo passado, Jesus – Filho e Servo de Deus, – se preparou para sua missão, hoje ele é mostrado diante da fase final de sua missão, prestes a subir a Jerusalém. Já tinha anunciado seu sofrimento aos discípulos, equivocados a seu respeito. No evangelho de hoje Pedro, Tiago e João são testemunhas de uma revelação de Jesus na glória de Deus: “Este é meu Filho amado, escutai-o!”. Antes de acompanhar Jesus no sofrimento, os discípulos recebem um “sinal” da glória de Jesus, para que saibam que o Pai está com ele quando ele vai dar a sua vida por todos. Pois não é só Jesus dando a própria vida, é o Pai que dá seu Filho por nós, como diz Paulo.
13. O gesto magnânimo de Abraão tornou-se imagem da incompreensível magnanimidade de Deus, que dá seu “Filho unigênito” para nós (Jo 3,16). Magnanimidade, de fato, muito mal compreendida. Há quem pense que Deus é um carrasco, que quer que seu Filho pague com seu sangue os pecados dos demais. Mas, muitos séculos antes de Cristo, os profetas negaram tal idéia: cada um é res-ponsável por seu próprio pecado (Ez 18; Jr 31,29, etc.). Deus não é vingativo nem san-guinário, mas antes de tudo rico em misericórdia e fidelidade (Ex 34,6; Sl 115,1). É por isso que ele dispões de seu Filho, para que este nos mostre a misericórdia e fide-lidade de Deus por sua própria prática de vida. Jesus é Filho na medida em que sua atitude representa o amor fiel de Deus. É precisamente no momento de subir a Jerusalém para enfrentar a inimizade mortal das autoridades, que isto se verifica. Jesus poderia ter virado o casaco, desistido de suas bonitas lições sobre o amor fraterno, poderia ter salvo a sua pele. Não quis. Quis ser a imagem do amor fiel de Deus. Por isso, quando Jesus dá sua vida por nós, é o Pai que a dá.
14. Nossa mentalidade egocêntrica, alimentada pela ideologia da competição e do consumo, dificilmente admite que Deus possa ser imaginado com uma magna-nimidade tão grande, como alguém tão generosos que aceita a fidelidade de Jesus até o fim como se fosse o dom de seu único filho e herdeiro: “Este é meu Filho amado!” Nele, Deus se reconhece a si mesmo, reconhece seu próprio modo de agir.
15. QUARESMA é tempo de penitência, conversão, oração, escuta da Palavra de Deus, jejum e esmola-solidariedade. Muitos (e nós também…) preferem ficar na montanha … na admiração, na contemplação. É muito mais tranqüilo. Assim não precisa passar pelas dificuldades da vida, pelos sofrimentos, pela cruz … mas Jesus diz que é preciso descer da montanha, desfazer-se de “tendas provisórias” e ir ao encontro de todos os que necessitam, aqui embaixo na terra e morar com eles, no sentido de estabelecer com eles uma fraternidade e participar da construção de uma história de vida digna para todos.
16. CAMPANHA DA FRATERNIDADE. Tanto o evangelho quanto a 1ª. leitura que defendem a vida (com saúde, em plenitude) devem nos levar a meditar profundamente sobre a CF – Fraternidade e Saúde. Se somos chamados a construir o Reino de Deus já aqui nesta terra, então, que seja um Rei- no de filhos de Deus, de pessoas sadias, saudáveis, dispostas, alegres e felizes. Saúde é dom de Deus, mas também fruto de solidariedade e fraternidade.
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